quarta-feira, outubro 30, 2024

o alfinete


Sempre foi pequena e magra.
Cruéis, como as crianças também sabem ser, as "amigas"chamavam-lhe "alfinete", como forma de a magoar.
Companheiras de escola, meninas, também crianças, sentiam uma inveja verde daquela miúda tímida.
- Chegou o "alfinete" - gritavam todas as manhãs, à hora de entrar para a escola.
E ela ficava triste, por não ser reconhecida por aquele bando de miúdas cruéis como um bom ser humano. Chorava ao chegar a casa.

Contou ao Pai, o seu herói e protector.
- Amanhã, tu e eu resolvemos isso, filha - disse, com ar maroto.
E ela confiou no Pai. Sempre confiava no Pai.

No dia seguinte, o Pai levou-a, ele próprio à escola.
Assim que a viram chegar, uma das meninas urubus do costume gritou:
- Chegou o "alfinete".
Ela olhou o Pai, já ansiosa.
O Pai deu-lhe a mão e chamou a outra miúda.
- Anda cá, ó tu! - era assim o Pai.
A outra miúda, líder do grupo de urubus, com um corpo atarracado e gordinho, veio obedientemente, receosa.
Aí, o Pai disse:
- Porque chamas tu "alfinete" à minha filha? Logo tu que és feia, és torta e gorda? Não tens espelho em casa?
Ela rejubilou por dentro. Ficou calada por fora. "YES!!! Este é o meu Pai!"
A outra miúda, baixou os olhos e foi embora, com lágrimas nos olhos.

Depois, o Pai disse:
- Olha, filha, não te incomodes com isto. Elas são invejosas. Chamam-te "alfinete", porque invejam o teu corpo, têm ciúmes das tuas boas notas, têm inveja que tu cantes e dances e toques instrumentos musicais, que sejas bem sucedida em tudo o que fazes. Quando fores mais velha, aos 30 anos, vais parecer que tens 20 e aos 40, vais parecer que tens 30. E nessa altura, elas serão gordas e feias e sem nada naquelas cabeças.

As lágrimas da menina secaram.
Ah! Pai!
Como foram certas estas palavras. Hoje, em idade adulta, esta menina, que era o "alfinete", assumiu a palavra como nickname.
O uso de"Alfinete" mostra precisamente que o Pai estava certo.

[Como é que o Pai sabia?]

[Foto de Amora Silvestre]

(Texto publicado originalmente a 28 de Março de 2006)

1 comentário:

Pete disse...

Opá... que ternura... :o)))
O Pai tinha muita razão... muita mesmo.... :o))))