Os sons habituais de quem sai do trabalho, no final de mais um dia.
Sentada no sofá, os únicos sons dentro de casa eram os respirares dos dois animais que estavam na sala. Num daqueles raros momentos de completa serenidade, um ao colo, o outro deitado ao meu lado direito, chegou uma dor que tinha anos. A morte de uma companheira de vida.
Há cinco anos que ela morreu, depois de uma doença prolongada que lhe provocou, para o final, um sofrimento atroz. Foram muitas noites sem dormir para acompanhar este sofrimento, para estar ao lado dela, enquanto o desconforto do animal era tão grande - sim, era uma cadela - que não sossegava, nem ela, nem eu.
Depois de semanas, surgiu a opção - única e terrível - de que, para minimizar aquele sofrimento, ela tivesse que ser abatida.
Fui com ela à veterinária habitual, que a conhecia neste processo de queda de saúde progressivo e extremamente doloroso. Já nada havia a fazer, naquele momento, para que o animal sofresse menos.
A frase que eu mais temia, surgiu:
- A decisão é sua. Vá dar uma volta, pense um pouco e regresse quando souber mesmo o que quer fazer.
Conduzi às voltas; parei muitas vezes, olhei para ela, sentada ao meu lado, no banco do carro. Ela olhou-me com os olhos habitualmente já tão mortiços e naquele momento, como se soubesse, extremamente vivos e atentos.
- A decisão é tua!
Foi com este peso que chorei e chorei e chorei.
Falei com ela como se fala a um ser humano. Expliquei-lhe, entre palavras entrecortadas, que era uma das decisões mais difíceis da minha vida, que não sabia o que fazer. Dei-nos todo o tempo que tínhamos, ali, as duas juntas. Olhámo-nos o tempo todo.
E aqueles olhos, expectantes, diziam-me tudo. O sofrimento já não dava para suportar!
Aqueles olhos...
Regressei à veterinária. Tomei a decisão. Foram-me explicados os procedimentos e fui aconselhada a esperar lá fora, se achasse que me sentiria menos mal. Decidi fazê-lo.
Foi pior.
Porque no momento em que a depositei sobre a marquesa, ela despertou, como se soubesse. Ela soube, o tempo todo! Já não conseguia andar, mas sentou-se, como antes se sentava e olhou-me uma última vez. Tenho esses olhos cravados nos meus e a imagem fugidia de um corredor com ela sentada na marquesa e a voz tranquila da veterinária, a falar com ela.
Saí.
Faz agora cinco anos e dou comigo sentada aqui no sofá, com os meus dois animais companheiros de vida. Demorei quatro anos a fazer este luto. Durante quatro anos, não conseguia suportar a ideia de perder outro animal e não tive animais durante todo esse tempo.
Hoje, percebi que não foram quatro, já lá vão cinco, que a dor da perda é muito grande, que a minha maior perda não foi a decisão que tomei, mas sim o facto de ter tomado a decisão de sair; de não a ter segurado ao meu colo, a ouvir a minha voz, enquanto partia.
Hoje, neste anoitecer tranquilo, normal, como todos os outros, ao sentir os meus animais, companheiros de vida actual, senti novamente esta perda e tomei a decisão de, nunca mais, nunca mais, deixar partir alguém que viva comigo, sem a minha presença.
A saudade é imensa, mas a dor de não ter estado presente para ti, é maior.
Conchinha... ainda hoje não tenho palavras para te dizer o que sinto! Talvez só uma baste... desculpa!
E aqueles olhos, expectantes, diziam-me tudo. O sofrimento já não dava para suportar!
Aqueles olhos...
Regressei à veterinária. Tomei a decisão. Foram-me explicados os procedimentos e fui aconselhada a esperar lá fora, se achasse que me sentiria menos mal. Decidi fazê-lo.
Foi pior.
Porque no momento em que a depositei sobre a marquesa, ela despertou, como se soubesse. Ela soube, o tempo todo! Já não conseguia andar, mas sentou-se, como antes se sentava e olhou-me uma última vez. Tenho esses olhos cravados nos meus e a imagem fugidia de um corredor com ela sentada na marquesa e a voz tranquila da veterinária, a falar com ela.
Saí.
Faz agora cinco anos e dou comigo sentada aqui no sofá, com os meus dois animais companheiros de vida. Demorei quatro anos a fazer este luto. Durante quatro anos, não conseguia suportar a ideia de perder outro animal e não tive animais durante todo esse tempo.
Hoje, percebi que não foram quatro, já lá vão cinco, que a dor da perda é muito grande, que a minha maior perda não foi a decisão que tomei, mas sim o facto de ter tomado a decisão de sair; de não a ter segurado ao meu colo, a ouvir a minha voz, enquanto partia.
Hoje, neste anoitecer tranquilo, normal, como todos os outros, ao sentir os meus animais, companheiros de vida actual, senti novamente esta perda e tomei a decisão de, nunca mais, nunca mais, deixar partir alguém que viva comigo, sem a minha presença.
A saudade é imensa, mas a dor de não ter estado presente para ti, é maior.
Conchinha... ainda hoje não tenho palavras para te dizer o que sinto! Talvez só uma baste... desculpa!
(Texto publicado originalmente a 26 de Setembro de 2006)
3 comentários:
Comovente..e pq nãos e são os nossos verdadeiros amigos?
Beijos
Realmente sei o que sentes, já perdi vários, embora só na última me tenha sido posta a questão de sair ou ficar. Saí. Deixei lá a minha esposa, elas estavam muito mais ligadas as 2, depois tinha de me preparar pois a dura tarefa de coveiro era-me destinada.
Enterrei-a no jardim, por baixo de uma figueira, e até hoje, já lá vão 8 anos, a minha mulher nunca mais comeu um figo.
Fica bem!
...estou todo arrepiado...de emoção..também adoro animas...
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